domingo, 13 de outubro de 2013

CASA PIA - PARA QUEM TEM MEMÓRIA CURTA

Esta entrevista foi-me dada por Carlos Silvino em Janeiro de 2011. Hoje em dia, na prisão, ele continua a manter a mesma versão com os companheiros de cela que tem. Carlos Silvino não é nenhum santo, mas, pelas muitas horas de entrevistas que tive com ele, não é o monstro que a generalidade da Comunicação Social pintou e muito menos uma pessoa capaz de ser o cabecilha de uma vasta rede de pedofilia. Por uma simples razão: não tinha capacidades intelectuais para isso. E quem disser o contrário é tão falho de inteligência como este homem com mente de criança... Exclusivo PROCESSO CASA PIA Espantosa confissão de Carlos Silvino “Fui obrigado a mentir. São todos inocentes” “O senhor Carlos Cruz é inocente. São todos inocentes. Nunca transportei crianças para quem quer que seja.” A surpreendente confissão pertence a Carlos Silvino da Silva, o ex-motorista da Casa Pia de Lisboa que alegadamente chefiava, de acordo com a investigação do Ministério Público, uma alegada rede de pedofilia a operar naquela instituição e cujo processo culminou na condenação, em 1ª Instância, do conhecido apresentador televisivo Carlos Cruz, do embaixador Jorge Ritto, do médico Ferreira Diniz, do advogado Hugo Marçal e do ex-provedor Manuel Abrantes, além dele próprio. Mas esta é apenas uma das espantosas revelações feitas pelo homem cuja “confissão” em tribunal serviu para sustentar todas as condenações. Isto, porque o tribunal se baseou apenas nos testemunhos das próprias vítimas para condenar os arguidos, acreditando que todos eles estariam a ser honestos por haver uma “ressonância de verdade”, um termo que não existe no nosso ordenamento jurídico, tendo sustentado essa “ressonância” com o facto de Carlos Silvino ter corroborado os depoimentos dos indivíduos alegadamente abusados. Afinal, garante Carlos Silvino, é tudo mentira e o que disse em tribunal terá sido, segundo ele, por força da manipulação policial e do seu próprio advogado, José Maria Martins, das drogas que lhe terão sido ministradas e da pena que teve das alegadas vítimas que, assegura, foram espancadas e coagidas a acusar os condenados. O que agora oferecemos ao leitor não é uma entrevista no sentido formal do termo, mas sim o resultado de cinco longas conversas mantidas com Carlos Silvino em datas diferentes e que incluiu visitas a alguns dos locais onde alegadamente teriam ocorrido abusos. Não se trata de uma reprodução palavra por palavra daquilo que Carlos Silvino disse, mas em momento algum é desvirtuado o sentido do que ele pretendeu transmitir (facto que é possível comprovar pelas gravações áudio e vídeo existentes): É verdade que liderava uma rede de pedofilia e levava crianças da Casa Pia ao Carlos Cruz e restantes condenados? Fui obrigado a mentir, o Carlos Cruz é inocente. São todos inocentes. Nunca transportei crianças para quem quer que seja. É tudo mentira. O Dr. Abrantes nunca esteve em Elvas, nunca esteve em lugar nenhum. Esteve na Provedoria, no seu gabinete. Fazia o serviço na provedoria, na contabilidade, no serviço de transportes, na secretaria… nunca lhe levei rapaz nenhum. Ninguém é culpado de nada. Então porque mentiu ao longo de tanto tempo? Já disse. Fui obrigado a mentir. Estava sempre drogado. Tomava 32 comprimidos por dia. Durante mais de três anos não soube o que era dormir e não me lembro da maioria das coisas. Só agora, que deixei a medicação, é que me estou a aperceber o que me fizeram. O meu advogado pode ser muito bom, mas em relação a mim não se portou bem. Só estou à espera de ter uma conversa com o bastonário da Ordem dos Advogados para me livrar dele. Agora ainda quer que eu acuse o Paulo Pedroso. Ele que tire daí o cavalinho da chuva, porque eu não vou acusar mais nenhum inocente. Lembro-me que ainda tentei dizer a verdade em tribunal, mas a juíza e o meu advogado não me deixavam. Na maior parte das sessões eu só estava lá fisicamente. Fui ouvido dezenas de vezes na PJ sem advogado e sempre que chegava à sala de interrogatórios estava lá um copo de água que me obrigavam a beber. Ficava logo doente e mal disposto. Havia qualquer coisa naquela água, mas eles obrigavam-me a beber. Sei que só assinei um papel na Judiciária, mas agora aparecem uma data deles assinados por mim. São assinaturas fotocopiadas, porque eu não me lembro de assinar nada. Quando eu vinha dos interrogatórios os guardas percebiam logo que eu estava drogado. Quando me iam buscar para ser interrogado eu só pensava: “Lá vou ter de beber outro copo de água…” Mas porque motivo assumiu em tribunal a prática de crimes considerados hediondos e que agora garante não ter cometido? Fui levado a isso. O meu advogado disse-me que era o melhor para mim. O próprio inspector Dias André fartou-se de dizer o mesmo. Diziam-me que eu era inocente, que eu não tinha violado ninguém, mas que o importante era condenar os outros. Esses é que os rapazes diziam que eram os abusadores e deviam pagar pelo que tinham feito. Como eu estava fortemente medicado e não estava em mim, acabei por concordar e acusei inocentes. Já disse que foi obrigado a mentir. Então e os rapazes, também foram obrigados a mentir? Claro que foram. Das centenas de rapazes que foram ouvidos apenas um grupo de 30 é que me acusa e sem qualquer prova. Quase todos dizem que foi na garagem em dia indeterminado, a hora indeterminada… Devia andar toda a gente a dormir na Casa Pia para que eu nunca fosse apanhado. Ou então sou um sortudo dos diabos. Com a quantidade de abusos que dizem que eu cometi só por milagre é que ninguém me apanharia. Acusaram-me inicialmente de mais de mil crimes e no fim já eram pouco mais de 100. Andamos a brincar? Em relação aos rapazes que acusam os outros arguidos ainda é pior. São apenas seis ou sete e todos jovens problemáticos, com comportamentos deploráveis na Casa Pia. Alguns deles violaram vários colegas e outros telefonavam a um Inglês para os ir buscar quando precisavam de dinheiro, conforme disseram à PJ num processo que correu em Oeiras. Esse processo foi antes do da Casa Pia e os dois rapazes que acusavam o inglês vieram anos mais tarde acusar o Carlos Cruz e o embaixador Jorge Ritto. Porque motivo não os denunciaram logo que o inglês foi preso? Aquilo que penso é que não conheciam os arguidos que agora ajudaram a condenar. Pressionar estes rapazes a dizer o que interessava foi fácil para na PJ. Tinha-os a todos na mão. Um deles, o Luís Marques, esteve uma semana preso num reformatório na Graça, a passar fome, e quando foi ouvido em tribunal só dizia: “eu digo o que quiserem, mas não me mandem outra vez para a prisão”. Isto tem de estar gravado. Se não está é porque alguém apagou. Além disso, prometeram-lhes dinheiro, o que se veio a confirmar. Por dinheiro estes rapazes fazem tudo. Alguns até eram prostitutos, vendiam o corpo em Belém e no Parque Eduardo VII. Por alguma razão eles estiveram com protecção policial. Não era por correrem perigo, mas sim porque a Catalina e o Dias André tinham medo que se os rapazes fossem pressionados pelos jornalistas acabariam por dizer a verdade. O João Paulo Lavaredas, como estava aflito de dinheiro, ainda tentou contar tudo a um jornalista, mas depois foi logo preso no Brasil e a história morreu. Vamos por partes. Falemos dos restantes arguidos. Conhecia o Carlos Cruz? Conhecia. Um dia estava nos Pastéis de Belém e entrou o Carlos Mota, que eu conhecia por ser cliente de uma oficina de motas onde eu também ia, que era do “Manuel das Motas”. Ele estava acompanhado de algumas pessoas e lembro-me de ele me cumprimentar e de me apresentar o Carlos Cruz e o Vítor de Sousa. Cumprimentei os dois e eles foram às suas vidas. Nunca mais falei com ele em toda a minha vida. E o embaixador Jorge Ritto? Simplesmente nunca o vi. Não sabia quem era. Levaram-me a uma casa na Cruz Quebrada que a PJ me disse que era dele e obrigaram-me a dizer que tinha levado crianças para ali. É mentira. Nunca estive naquele sítio, nem numa casa em Cascais onde também me levaram e que também me disseram que era do embaixador. Hugo Marçal? Esse foi meu advogado e só o conheci a partir daí. Ele deixou ficar um bilhete na prisão e pediu-me para o contactar. Soube depois que ele tinha concorrido a um cargo na Casa Pia e que alguém lhe falou de mim. Como ele era especialista em crimes sexuais e até estava a fazer um doutoramento nessa área, interessou-se pelo meu caso. Depois armaram-lhe uma cilada. Meteram umas latas debaixo do carro e alguém avisou a polícia que estava lá uma bomba. O coitado nesse dia tinha ficado sem carta de condução, porque vinha ter comigo e atrasou-se. Foi apanhado em excesso de velocidade. Estava lá ele a ver o que se passava e um agente da PJ ligou para um operador de câmara da SIC para fazer um grande plano do Marçal. Ao pé desse e de outro agente estava o Francisco Guerra e os polícias disseram-lhe que o Marçal era o meu advogado. À noite, quando a notícia estava a dar nas televisões, ele foi a correr dizer à Catalina Pestana: “Olhe, aquele era um dos que estava em Elvas. Já fui a casa dele”. Mentira. Ele nunca foi a casa do Hugo Marçal. Depois, como a PJ lhes mandou indicar a casa da Gertrudes Nunes, ele passou a ser porteiro… Depois dele ser preso, a minha meia-irmã veio dizer, sem eu saber, que era o Carlos Cruz que estava a pagar ao Hugo Marçal. Já me zanguei com ela várias vezes por causa disso. Ela disse-me que foi o que lhe tinham dito, mas não me revela quem é que foi essa pessoa. Mas eu sei que é mentira. O Carlos Cruz nunca pagou nada ao Hugo Marçal e nem se conheciam. Depois a minha irmã contratou o José Maria Martins, pagou-lhe cinco mil euros, e foi nessa altura que começou a minha desgraça. Ferreira Diniz? Conhecia, mas apenas dos jogos de futebol do Atlético e dos treinos, onde ele costumava ir com um rapaz que acho que é companheiro dele chamado Ricardo Torres. Fui uma vez ao antigo consultório dele, não ao que é referido no processo, porque tive um problema num joelho. Ele olhou para a perna e receitou-me uns medicamentos. Mas nem sequer cheguei a entrar no consultório. Também me levaram, os agentes da PJ, ao novo consultório dele, mas eu não conhecia nem nunca tinha estado lá. Também nunca lhe levei ninguém. Gertrudes Nunes Nunca a tinha visto na minha vida. Nem a ela nem à casa. Quando lá fui o meu advogado é que me disse: “Aquela é que é a casa que tens de indicar”. Eu disse que sim, mas não fazia a menor ideia de quem ali vivia. Fui lá levado pela PJ. Levaram-me da prisão e fui com polícias e o meu advogado a Elvas. Quando lá chegámos o meu advogado é que me disse qual era a casa que tinha de indicar. Eu não fazia a mínima ideia. Nunca ali tinha estado. Disseram-me para dizer que era aquela e eu disse. Manuel Abrantes Conhecia, porque era o meu chefe e casapiano. Mas nunca lhe faltei ao respeito nem o mandei à “m…” ou à mãe dele. Tinha e tenho muito respeito por ele, fazia o que me mandava e pronto. Nunca me protegeu. Ele até foi instrutor de processos contra mim. Pediu-me alguns favores, é verdade, mas o provedor Luís Rebelo e o outro provedor adjunto também me pediram muitos. Nunca houve nada de anormal ou qualquer tipo de favorecimento. Então o dr. Abrantes nunca esteve em Elvas, nem foi à Buraca (onde uma das vítimas diz que foi abusada por Manuel Abrantes e Ferreira Diniz, numa casa que o tribunal não conseguiu identificar e em dia indeterminado) … Ele nunca esteve em Elvas, nem na Buraca, nem em Colares. O Francisco Guerra fala em Colares e coloca lá o Dr. Abrantes. Mais ninguém falou em Colares além dele e do Ricardo Oliveira. Até colocam lá e noutras casas o Ferro Rodrigues, o Jaime Gama e o Paulo Pedroso. Tenho de falar com eles e explicar-lhes tudo. Eu sei que o Ferro Rodrigues agora deve andar ocupado por causa do netinho, mas tenho de falar com ele o mais rápido possível. Eu quero mesmo processar quem me obrigou a fazer isto. E Herman José, Francisco Alves e Paulo Pedroso? Não conhecia pessoalmente nenhum deles. Só fiquei a conhecer depois do processo e em tribunal. Falando agora dos locais onde terão ocorrido abusos. Pelo que já deu a entender Elvas não existe… Não existe Elvas, nem Colares, nem mais sítio nenhum. E a “casa dos erres”? Nunca fui lá e fui obrigado a dizer que sim. Levaram-me lá e fui sem advogado. Nos papéis (autos de reconhecimento da PJ) dizem que eu dispensava o advogado naquela diligência. Na altura nem advogado tinha. Nunca dispensei advogado nenhum. E o Dr. Dória Vilar (um dos ex-advogados de Carlos Silvino) foi dispensado porque o Dr. José Maria Martins me mandou escrever um papel dizendo-me que era melhor correr com o Dr. Dória Vilar porque ele andava a almoçar e jantar com os advogados do Carlos Cruz. E também nunca fui ao Taguspark com eles. Tive que dizer que sim. Até tive que inventar, porque os rapazes disseram, que tinha camisolas e t-shirts que o Jorge Ritto me tinha dado. E eu com a medicação… só bebia água Esteve na casa da Avenida das Forças Armadas onde o Carlos Cruz é acusado de abusar de menores? Fui lá sete vezes sempre levado pela PJ e sem ninguém a acompanhar-me. Os agentes é que me explicavam: “Eles diziam que entravam por ali (porta das traseiras do prédio 111 onde terão ocorrido os abusos e que estava fechada por dar acesso a uma empresa), diz também, que é para os culpar a eles. Os rapazes têm pena de ti, os outros é que lhes fizeram mal”. Mas porque motivo aceitou dizer que sim, que esteve lá? “Estava drogado e tive pena dos rapazes. Tive pena porque eles levavam porrada. Todos os dias via vinte e tal deles (jovens) nos corredores da PJ e alguns a escorrer sangue. Também nunca estive com o Carlos Cruz no restaurante “Dois e Dois”, nem almocei com ele na Avenida 5 de Outubro. Dizem que foi num restaurante ao pé da PT, mas eu nem sabia onde ficava a PT, quanto mais o restaurante. Foi tudo inventado pelo Francisco Guerra. Alguém lhe fez alguma proposta para mudar de aparência e ter estatuto de arrependido? A mim ninguém ofereceu nada. Falou-se disso na televisão, mas eu nunca soube de nada. Deram-me foi medicação. Então eu nunca fui ouvido pelo juiz Rui Teixeira e no DIAP não falei com as procuradoras (Cristina Faleiro e Paula Soares). Não estive lá nem dois minutos. Um outro juiz é que me recebeu e limitou-se a dizer a uma funcionária, que acho que se chamava Rosalina: “Rosalina, pode mandar o senhor embora”. Nem falei com o homem. Depois apresentaram-me um homem, voltei a entrar com esse homem e depois saí e vim-me embora para a prisão. Durante o tempo que esteve na prisão a PJ ia lá buscá-lo? Sim, sim, sim. Sem autorização do tribunal e sem autorização do advogado. O Hugo Marçal tem razão quando fala disto no livro. Alguma vez levou crianças para serem abusadas em Elvas pelo Paulo Pedroso? Conhecia o Paulo Pedroso? Não, não. Só conhecia o Paulo Pedroso de vista, por vê-lo na Casa Pia. Só depois é que vim a saber, na Polícia Judiciária, que ele tinha ido almoçar à Casa Pia. Pensei para mim se seria um senhor que eu tinha visto com uma camisa aos quadrados nesse almoço e depois pela fotografia publicada nos jornais percebi que sim. Nem nunca soube que ele era meu ministro. Só soube depois de começar o julgamento. E o meu advogado já diz que ele ia em 92 e 91. Eu sei lá se ele ia lá. Não sei. Eu andava no pão (distribuição. Até 93, 94 eu andava no pão. Não sei. Não posso dizer… Gostava de falar com o Paulo Pedroso também. Mas primeiro tenho de arranjar um advogado mesmo com “c…” e que seja honesto. Eu não tenho dinheiro para pagar, mas vou falar com o Dr. Marinho Pinto. Eu perdi o meu emprego, perdi o pão de cada dia, não tenho dinheiro… O Carlos está a passar fome? Estou. E há muito tempo. Ia à Santa Casa de Misericórdia dos Anjos, tenho um papel para ir lá buscar comer, mas agora vão-me arranjar um sítio aqui mais perto da minha casa. Tenho andado a pé, as pessoas conhecem-me, cumprimentam-me e dizem que eu sou um pobre desgraçado. Mas se era chefe de uma rede não era para ter muito dinheiro? Isso é o que o “coiso” (inspector Dias André) diz. Eu nunca fui chefe de nenhuma rede. E o Francisco Guerra era o seu braço direito? Não. E isso de eu ser o chefe de uma rede foi tudo montado pela Dra. Catalina Pestana para correr com a direcção e acabar à frente da Casa Pia de Lisboa. Ela, o Pedro Namora e o Adelino Granja é que deram início a isto tudo. Uma caça às bruxas. Um dos jovens, o Lauro David, diz, por exemplo, que esteve com o Dr. Abrantes numa casa da Buraca e que esteve em Elvas onde também terá sido abusado pelo Dr. Abrantes e pelo Carlos Cruz. É verdade? Não esteve. Então o Francisco Guerra diz que eu ia buscar rapazes aos colégios, como é que isso era possível sem os educadores saberem de nada e sem a direcção saber de nada? Não pode ser. Isto foi tudo combinado pelo Dias André, Rosa Mota, com a Catalina Pestana e com mais gente. E o Pedro Strecht, que andou a dizer, enquanto estivemos presos, que algum de nós o ameaçou. Como é que podia ser? Depois teve segurança. Depois veio-se a saber que só teve dois dias de segurança porque não tinha nenhuma ameaça especial. Se foi ameaçado, foi por pessoas de fora que souberam que os rapazes tinham levado porrada. Os rapazes nem podiam sair dos lares com os educadores. Eram sempre acompanhados de polícias (…). Vila Viçosa? O Francisco Guerra diz que o Carlos o levou lá para ele ser abusado pelo Ferro Rodrigues… O Francisco Guerra diz à PJ que eu levei três rapazes ao Ferro Rodrigues e com ele quatro. No livro diz que eu fui buscar dois rapazes e com ele três. Face a isto (…) E diz que há mais de dez anos que tinha telemóvel. Alguma vez ele com 12 ou 13 anos tinha telemóvel e ia daqui para o estrangeiro com cassetes? Diz que o levei a Salamanca, mas eu nunca estive em Salamanca. Nem sei onde é. Alguém acredita numa barbaridade destas? Fraldas, ele usa fraldas porque foi a polícia que lhe espetou qualquer coisa lá. Estou-lhe a dizer. O Francisco Guerra foi violado na Maia, no Porto, num colégio de padres. Foi violado lá por três rapazes. Até o meu afilhado obrigaram a assinar um papel onde dizia que eu tinha abusado dele. Em tribunal ele disse que tinha sido pressionado a assinar o papel pela Polícia. Isto está gravado. Mas ninguém ligou. Também disseram que eu conhecia o general Ramalho Eanes e que até tinha almoçado com o homem e dado boleia aos filhos. Eu nunca almocei com ele. Não o conheço pessoalmente nem aos filhos. Alguma vez isso era possível? Nem pensar… E o Carlos foi obrigado a assinar algum documento? Não me lembro se fui ou não obrigado. Mas há muitos documentos onde a assinatura que está lá é fotocopiada. Não fui eu a assinar. Há depoimentos com coisas que eu terei dito, mas das quais não me lembro. Se disse, e tenho muitas dúvidas, foi sobre o efeito de medicação muito forte. No dia em que terei feito a primeira confissão a acusar toda a gente lembro-me de os guardas terem dito que eu não estava em condições para ir a lado nenhum. Estive lá até às quatro da manhã, falo aqui (no auto onde consta a confissão) do Paulo Pedroso, de uma residência, mas eu não me lembro de nada disto. Nada do que está neste documento sou eu que escrevo. Já estava escrito. A medicação é que fez isto tudo. Eu fui internado em Caxias porque já não andava bem. Quando saí de lá parecia um esqueleto. Todos os dias me tiravam sangue. Para quê? Eu não pedi para ir para o hospital (…) Estive lá 17 dias. Eu nunca pedi dieta na minha vida. O Dr. Dória Vilar quando me foi lá visitar pela quarta vez ficou chocado. Eu não comia e não dormia. Só levava injecções e tiravam-me sangue. Depois ainda aumentaram a medicação. É depois disso que aparecem os documentos onde eu envolvo essas pessoas, tinha saído do hospital há pouco tempo. Até fui à TVI dizer que o Carlos Cruz era um pedófilo. Nesse dia, antes de ser entrevistado, até me senti mal e estive quatro horas a ser assistido numa ambulância. Estava fragilizado e o meu advogado nem deixou que chamassem o meu psiquiatra para me dar apoio. O Carlos esperava ser condenado a 18 anos de prisão? Se eu estava à espera da condenação? Eu desde que fui enterrado nesta “mer…” que penso que fui vítima desse pedófilo, o relojoeiro Américo Henriques, que abusou de cinco raparigas e que depois disto conseguiu meter toda a família a trabalhar na Casa Pia. Ele é que me enterrou. Mas não, não estava à espera de ser condenado, nem à espera de estar preso sem haver uma causa para isso. Não há provas nenhumas contra mim. O Francisco Guerra, por exemplo, nunca esteve à porta da garagem onde diz que foi abusado, os outros motoristas podem confirmar isso. A partir das 18h15, os dois porteiros que rendiam os seguranças, o Machado e o Amílcar, disseram em tribunal que faziam a ronda e nunca o viram lá. E houve tantas contradições em tribunal e pessoas a desmentir as coisas que nunca pensei que o tribunal acreditasse. Como é que era o seu estado psicológico em tribunal? Estava muito mal. O Dr. José Maria Martins teve de chamar imensas vezes o psiquiatra para ao pé de mim. Então eu estava com medicação forte. Só agora é que deixei a medicação. Tomava 32 comprimidos por dia. Enquanto estive preso até os guardas achavam um exagero mas obrigavam-me a tomar porque eram as ordens que tinham da PJ, do Dias André. Até ao psiquiatra Afonso Albuquerque menti por estar drogado. Já lhe pedi desculpa, antes do Natal, porque ele escreveu num livro coisas que são mentira e que eu lhe terei dito quando ainda estava sob efeito da medicação. O Carlos quer pedir desculpa aos portugueses? Afinal de contas muitos portugueses acreditaram que estava a dizer a verdade… Sim, quero pedir desculpa a todos os portugueses. Só menti porque fui obrigado a isso. Mas podem ter a certeza de que nunca violei nenhum rapaz, nunca toquei no pénis de nenhum, nem nunca mostrei os meus órgãos genitais a nenhum deles. Disse em tribunal e digo outra vez, não sou pedófilo, não sou homossexual, nem predador sexual. Sou heterosexual e algumas raparigas com quem tive relações foram ao tribunal para confirmar isso mas nem sequer foram ouvidas. Não sei porquê. O julgamento começa com o Carlos a dizer: “Somos todos culpados”. Estava drogado nessa altura? Alguém lhe dava instruções sobre aquilo que deveria dizer? Sim. Já estava fortemente medicado. O meu advogado é que me dizia o que eu deveria debitar em tribunal. Qual era afinal a sua relação com o Francisco Guerra? Nenhuma. Nunca tive nada com ele. Quando ele diz que andava sempre comigo é mentira. Tudo mentira. Isso foi o Dias André que o mandou dizer. O Francisco Guerra esteve em Maria Pia. A única vez que estive com ele foi quando o trouxe, com dois rapazes do Lar Martins Correia, porque me pediram. Ele era considerado atrasado mental e o Dias André aproveitou-se dele para o obrigar a dizer estas coisas. Tenho uma carta escrita por ele antes de ser ouvido pela PJ e onde ele diz que só me conhece como sendo um motorista igual aos outros e que não tem conhecimento de nada que eu tivesse feito de mal. Já eu estava preso e não lhe podia fazer mal nenhum. De repente desata a dizer que era o meu braço direito. Aproveitaram-se da fraqueza dele e fizeram o que quiseram dele. O livro não foi ele que escreveu. Então ele não sabe escrever, como é que escrevia um livro? Foi a Catalina Pestana que escreveu e uma percentagem do livro até vai para uma associação que ela criou. Ele ia à provedoria porque andava a distribuir correio, mas nunca falou comigo, nunca o apresentei ao Dr. Abrantes, Os outros rapazes também foram obrigados? Claro. Então o Ilídio Marques (uma das alegadas vítimas) era para ser ouvido a 3 de Janeiro de 2005 e não foi porquê? Porque lhe enfiaram uma coisa pelo rabo acima e ele teve de ser operado. Nenhum deles foi violado. Aliás, conforme foi dito em tribunal, uma violação só é detectada se os exames forem efectuados dez dias após o acto. Se eles apresentavam esses sinais é porque lhes meteram alguma coisa pelos rabos acima. Nós não podíamos ser, porque estávamos todos presos… O João Paulo Lavaredas (alegada vítima), que está preso no Brasil por tráfico de droga, diz que me fez sexo oral na garagem da Casa Pia mais de 100 vezes. Todos os motoristas o desmentiram… Alguma vez foi agredido verbal ou fisicamente na PJ? Verbalmente sim. Muitas vezes. Sobretudo pelo Dias André. Ele era arrumador de carros e de repente tem um processo destes nas mãos. Ele só desejou protagonismo. Veja lá que eu tirei o chip do telemóvel da Casa Pia e comi-o, mas depois vieram dizer que eu tinha não sei quantos números gravados nesse cartão. Como é possível se foi destruído? Não tinha lá nada de importante, só os contactos de serviço, mas o Dias André não sabia disso. Por isso inventou. Aliás, a minha carteira, com os meus documentos todos e cartão multibanco, desapareceu. O Dias André tem de saber dela. Alguém levantou todo o dinheiro que eu tinha no banco. Não era muito, mas era meu. Foi ganho com o meu suor. Não foi a traficar nem a vender ninguém. Fiz serviços em colégios particulares, eu e os meus colegas, e nunca houve queixas de ninguém. Se eu era o predador que o tribunal diz que sou então não havia queixas desses lados? Um pedófilo, dizem os entendidos, não se consegue controlar… Repito, não sou pedófilo. O Dias André disse várias vezes alto e bom som que não havia “filho da p…” nenhum que lhe metesse medo. Nem o presidente da República, nem o procurador-geral da República, nem o director da PJ, ninguém lhe metia medo porque ele é que mandava e se fosse preciso metia-os a todos na prisão. Era assim. Ele não estava presente nos interrogatórios, mas aparecia sempre para mandar umas bocas. Alguém lhe tentou fazer mal? Nunca. Aliás, foram os próprios polícias que andavam comigo que me perguntaram: “Mas porquê que o senhor Carlos tem segurança?” Eu só dizia, não sei, não sei. Nunca perguntei ao advogado, mas sei que eram ordens do inspector Dias André. E também nunca ameacei ninguém como o Francisco Guerra diz no livro dele. Isso é tudo mentira. Teve alguma conversa com a Dra. Catalina Pestana? Tive, mas não fui eu que pedi. No dia a seguir a ter feito a tal confissão, que só acabou às 4 da manhã, levaram-me à Avenida das Descobertas para identificar a tal casa dos “erres”, onde nunca tinha estado. Só fui lá com a polícia e foi a PJ que me indicou que era aquela casa que os jovens que foram a Elvas referiam. Depois levaram-me para uma praia. Eu ia num carro ensanduichado entre três polícias no banco de trás e com o Dias André no pendura e outro agente a conduzir. Vinham 12 carros atrás de nós. Nessa praia estacionaram os carros junto a um canavial e vi vários polícias com caçadeiras nas mãos. Apareceu então a Dra. Catalina Pestana a tentar convencer-me a denunciar as pessoas que faziam parte da rede, mas eu não lhe disse nada. Se não havia rede nenhuma o quê que lhe podia dizer? Como fiquei calado, ela foi ter com a Rosa Mota (coordenadora da equipa da PJ) e disse-lhe: “Nada a fazer, ele não fala”. O Dias André foi ter comigo, mandou-me entrar no carro e voltei para a prisão. E agora, o que vai fazer? Agora vou pedir desculpas pessoalmente a todas os arguidos que acusei injustamente e explicar-lhes tudo o que se passou. Quero reunir-me com o Dr. Ferro Rodrigues, com o Dr. Marinho Pinto, com o Dr. Jaime Gama, com o cardeal patriarca de Lisboa, com o Paulo Pedroso, ir à Comissão de Ética da Assembleia da República e fazer uma queixa ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Também quero ser indemnizado pelo Estado por todo o sofrimento que me causou ao longo da minha vida. Não se esqueça que eu também fui abusado e isso está provado. Vou processar a Catalina Pestana, o Dias André, a Rosa Mota, o Pedro Namora, o Adelino Granja, o Francisco Guerra, o Bernardo Teixeira, o Hugo Marçal, o Carlos Cruz, a Manuela Moura Guedes e a Alexandra Borges entre outros. O Hugo Marçal e o Carlos Cruz porquê? Disse que lhes iria pedir desculpa? Vou mesmo pedir-lhes desculpa. Mas eles trataram-me por “Bibi” nos livros que escreveram e eu não admito isso a ninguém. O meu nome é Carlos Silva. Ninguém tinha autorização para me tratar por essa alcunha. Eu tenho direito ao meu bom nome. Ao Francisco Guerra, ao Granja e ao Bernardo porque escreveram mentiras e também vou processar as editoras. À Manuela Moura Guedes e à Alexandra Borges porque me enxovalharam publicamente e pagaram a vários jovens para me incriminarem e aos outros arguidos. E o resto? Aos outros por todo o mal que me fizeram e continuam a fazer. Este processo nasceu todo por uma tentativa de assalto ao poder da Casa Pia. A Catalina Pestana tinha um ódio fidagal ao Paulo Pedroso e ao Ferro Rodrigues porque queria fazer parte do Governo e nunca foi convidada. Também queria ser provedora e nenhum deles a nomeou quando foram ministros do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. O Pedro Namora queria ser provedor-adjunto e levar um amigo para provedor. Também queria protagonismo no Partido Comunista. O Granja queria ser dirigente do Bloco de Esquerda e o Dias André protagonismo. Mas sei que havia mais gente envolvida nisto e muitos interesses em jogo. É bom não esquecer que a Casa Pia tem um orçamento anual de milhões de euros e um património de grande valor. O Campo Pequeno, por exemplo, é da Casa Pia... Carlos Tomás

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